2. A proposta salvífica de Iahweh e a política
A política é uma realidade boa, embora, como tudo que depende da liberdade humana, suscetível de abusos. Mais ainda, a política é necessária, forma parte da realidade do homem criado à imagem de Deus; não deve, porém, ser confundida com a salvação que Iahweh oferece ao povo. Logo que uma determinada política se apresenta como a salvação, surge a oposição, especialmente profética. A salvação, dom de Deus, não deve ser confundida com a política humana, conquanto seja verdade que a política pode vir a ser uma mediação desta salvação.
Assegurada a não identificação entres salvação de lahweh e a política humana, deve ser igualmente sublinhado que, uma vez aceita a proposta salvífica divina, o povo compromete-se, num processo de libertação que é também político (êxodo) e na vivência da justiça e do amor efetivo, com repercussões diretas na área política (profetas). Quer dizer, aceitar a proposta salvífica de Iahweh implica assumir e desenvolver a dimensão política da existência humana. A teologia política atual 'tem razão quando afirma que a salvação privatizante e intimista está fora da ótica do Antigo Testamento. A revelação é uma realidade pública dirigida à comunidade, ao povo, à humanidade toda. A salvação oferecida por Deus atinge o homem inteiro, incluindo evidentemente, a dimensão sociopolítica da sua existência.
As estruturas sociais, políticas e econômicas que o homem cria são atingidas também pela interpelação à conversão e à transformação, de maneira que possam estar a serviço da humanização do homem e não da sua desumanização. Tanto as estruturas como as situações de opressão, e dominação, de miséria, de desumanização, em suas múltiplas manifestações que impedem ao homem crescer como homem, constituem negações da proposta salvífica, de Deus. Por isso, quem se abre a esta proposta assume o compromisso de lutar contra as diversas formas de marginalização, discriminação e desumanização. Compromisso este tão importante que ficará sendo, para os profetas, a pedra de toque da fidelidade a Iahweh (cf. Is 1,10-18; 58,1-8 etc.). Certamente estamos, assim, no âmbito político, sem sair, no entanto, da experiência da fé Javista.
Isaias 1, 10-18
10 Ouvi a palavra do Senhor, ó grandes de Sodoma, dai ouvidos à instrução do nosso Deus, povo de Gomorra • .
11 De que me serve a multidão dos vossos sacrifícios? diz o Senhor • .Os holocaustos de carneiros, a gordura dos bezerros, estou farto deles.O sangue dos touros, dos cordeiros, e dos bodes, não os quero mais.
12 Quando vindes apresentar-vos diante de mim,quem vos pede • que piseis os meus átrios?
13 Cessai de trazer oferendas vãs:a fumaça, tenho-lhe horror!
Lua nova, sábado, convocação de assembléia…não agüento mais crimes e festas • .
14 As vossas luas novas e as vossas solenidades,
detesto-as,são um fardo para mim,estou farto de suportá-las.
15 Quando estendeis as mãos, cubro os olhos,podeis multiplicar as orações, não as escuto: vossas mãos estão cheias de sangue • .
16 Lavai-vos, purificai-vos.Tirai do alcance do meu olhar as vossas más ações,
cessai de fazer o mal.
17 Aprendei a fazer o bem,procurai a justiça,chamai à razão o espoliador • ,
fazei justiça ao órfão, tomai a defesa da viúva.
18 Vinde e discutamos, diz o Senhor • .
Se os vossos pecados são como o escarlate,
tornar-se-ão brancos como a neve.
Se são vermelhos como o carmesim,
tornar-se-ão como a lã.
Pensando a nossa fé:
Quais são as formas de luta contra a desumanização que estão presentes na caminhada de nossa Igreja?
Como estamos nos comprometendo com estas lutas?
Para meditar:
Quem sou eu?
por Dietrich Bonhoeffer
teólogo luterano, torturado e morto no campo de concentração durante o nazismo.
Quem sou eu?
Seguidamente me dizem
que saio da minha cela
tão sereno, alegre e firme
qual dono de um castelo.
Quem sou eu?
Seguidamente me dizem
que da maneira como falo
aos guardas, tão livremente,
como amigo e com clareza,
parece que esteja mandando.
Quem sou eu?
Também me dizem
que suporto os dias do infortúnio
impassível, sorridente e com orgulho
como alguém que se acostumou a vencer.
Sou mesmo o que os outros dizem de mim?
Ou apenas sou o que sei de mim mesmo?
Inquieto, saudoso e doente,
como um passarinho na gaiola,
sempre lutando por ar, como se me sufocassem,
faminto de cores, de flores, de pássaros,
sedento de palavras boas, de proximidade humana...
Que sou eu?
Este ou aquele?
Sou hoje este e amanhã um outro?
Sou porventura tudo ao mesmo tempo?
Quem sou eu?
A própria pergunta nesta solidão
de mim parece pretender zombar.
Quem quer, porém, que eu seja,
tu me conheces, ó meu Deus:
SOU TEU.
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